Vídeo: Fausto Brites
Local: Lisboa (Portugal)
Vídeo: Fausto Brites
Local: Lisboa (Portugal)
Por Fausto Brites
Ao voltar de uma pauta, passando pelas proximidades da antiga Pedreira Nasser, no Bairro São Francisco, eu me deparei com uma cena interessante: uma rua transformada em um grande secador de arroz ao ar livre, com operários movimentando constantemente os grãos, sob o sol escaldante daquela tarde de 18 de março de 1976. O produto, depois de passar por aquele “processo”, era levado para a máquina beneficiadora e, a partir daí, chegava às mesas dos consumidores. A produção era alta no Estado, aproximando-se da estimativa, embora não uma superssafra.
“Bastou o início da colheita, na microrregião de Campo Grande, para que pelo menos uma rua da cidade e um pequeno beco fossem novamente transformados em ‘secadores’ de arroz e, a exemplo do que ocorre todos os anos, agora um pouco mais cedo que o normal”, informava a reportagem da edição do jornal Correio do Estado, de 19 de março de 1976. Entrevistei alguns dos trabalhadores, e um deles disse que “a rua com asfalto é o melhor secador do mundo”. Isto porque, conforme explicou, bastava que o produto fosse convenientemente espalhado para que o sol se encarregasse de tirar grande parte da umidade do grão, uma vez que o processo rudimentar de revolvimento fazia com que os de baixo passassem para cima e vice-versa.
A utilização da rua também tinha uma explicação: o baixo índice de circulação de veículos. Mas, conforme a reportagem, o local apresentava já “grandes manchas de terra e cascalho, o que tem atrapalhado um pouco os encarregados da secagem, que evitam os trechos mais sujos e varrem os mais limpos para o emparelhamento do arroz”.
O Correio do Estado informava, também, que a secagem na rua era um fato “mais do que normal” e, no caso, evidenciava não uma grande produção, mas “muito mais a falta de secadores, o que obriga os produtores a se utilizarem de todos os recursos para secar sua produção. Um simples olhar mostra que o arroz atualmente submetido ao processo de ‘secagem asfáltica’ é inferior ao do ano passado, com grãos menores e ainda com muita umidade”.
Quinze dias depois, a edição do dia 2 de abril trazia ampla reportagem sobre a produção de arroz na região sul do Mato Grosso (o estado não havia sido dividido). Informava que a colheita prosseguia normalmente e que, se a estimativa do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e da Secretaria de Agricultura não fosse alcançada, ficaria muito próximo de que isso ocorresse, “apesar de todas as doenças, pragas e da estiagem verificada em algumas regiões”.
Houve um período de seca nos últimos dias de março daquele ano, o que ofereceu excelentes condições para as colheitas, fazendo com que as máquinas trabalhassem aceleradamente, enquanto, segundo a reportagem, em outras áreas de produção menores, os ceifadores também se empenhavam na colheita para aproveitar o período da estiagem.
“De um modo geral, já se pode dizer que a produção total de Mato Grosso atingirá de 30 milhões a 32 milhões de sacas, muito embora a Secretaria de Agricultura garanta que atingirá 35 milhões previstas em janeiro, com base no último levantamento das áreas fechadas. Para muitos produtores, as três pesadas – e gerais – chuvas da semana que passou foram altamente benéficas, melhorando as condições das áreas plantadas em dezembro e que estavam ameaçadas de prejuízos de monta, estimados em torno de 40% a 50%. As chuvas encontraram as plantas com os cachos ainda verdes e propícios à formação de grãos, aumentando consideravelmente a produtividade”, conforme trecho da reportagem.
Informava, ainda, que nos municípios de Terenos, Aquidauana, Jaraguari, Rochedo, Bandeirante, Camapuã e outros que integravam a microrregião de Campo Grande, “os depósitos reservados para as sacas de arroz estão sendo totalmente tomados, o mesmo acontecendo com os espaços das empresas beneficiadoras que, diante da oferta, compram o mais que podem e chegam até mesmo a formar estoques nas calçadas”.
Naquele ano, para se ter uma ideia, só a microrregião de Campo Grande (para efeito de previsão da safra, Mato Grosso foi dividido em sete) tinha uma projeção de 690 mil toneladas.
Uma foto, na capa, mostrava as sacas de arroz empilhadas na calçada de uma das beneficiadoras de Campo Grande: mesmo não sendo considerada uma
superssafra, a colheita prosseguia refletindo o potencial econômico do grão e tendo Campo Grande, a “Capital Econômica” do Estado de Mato Grosso, como um desses pilares.
(Publicada no Correio do Estado em 28 de setembro de 2015)
Vídeo: Fausto Brites
Local: Espanha
Fausto Brites
A redação estava deserta. Os colegas tinham saído para almoçar e, eu, decidi ficar mais um tempo para terminar um texto. Na Remigton, já na terceira lauda (a reportagem era especial), continuava datilografando para terminar tudo antes das 13h. Na época, início dos anos 1980, esTe escriba trabalhava no diário Jornal da Manhã (hoje, extinto), n Rua Antônio Maria Coelho, entre a 14 de Julho e Avenida Calógeras, em Campo Grande, quando o telefone tocou e, do outro lado da linha, a pessoa informou que a Polícia Civil estava precisando de um jornalista, urgente. Motivo: um home havia assassinado outro, foi perseguido e se refugiara em uma casa. Concordou em se render, desde que fosse na presença de um jornalista.
Consegui uma carona e me desloquei até o local, na região da Vila Carvalho.
No caminho, fui pensando se valeria a pena participar do episódio. Afinal, jornalista não é personagem da notícia e deve evitar, ao máximo, de sê-lo. Claro que há exceções e, naquele instante, as consequências daquela situação poderia fazer vir a me tornar uma peça da história que naquele momento estava em curso.
Ao chegar no local, a movimentação era grande. Muitas pessoas, curiosas, eram mantidas à distância pelos policiais, mas acompanhavam todas as negociações.
O policial que comandava a operação explicou o que havia acontecido: uma discussão havia originado no assassinato. A vítima, segundo as informações, era de família muito conhecida e com histórico de reações violentas quando contrariadas. Depois de ter praticado o crime, o autor acabou sendo localizado e, na fuga, refugiou-se numa casa. Mandou as pessoas saírem e se trancou, ameaçando trocar tiros com a polícia se tentasse entrar.
Depois de muita conversa, à distância, com os policias, decidiu se entregar. Exigiu a presença de um jornalista para contar sua versão do crime e ter segurança de que nada aconteceria com ele.
O acusado do assassinato estava armado com a arma do crime (um revólver com seis balas no tambor) e fazia apariação esporádicas na janela perguntando se tinham encontrado um jornalista para ”negociar” com ele a sua rendição. A situação era tensa até porque, alguns dos policiais mais exaltados, não concordavam com a exigência. Para eles, o homem tinha que se entregar e pronto e não importava as consequências e, o cerco, estava muito bem feito o que evitaria sua fuga. Outros, mais ponderados, entendiam que deveriam fazer o acordo para evitar consequências mais graves pois tudo ali era imprevisível.
– O jornalista chegou! – gritou um dos policiais.
– Manda ele vir aqui, mas só ele! – respondeu.
O responsável pela ação policial perguntou se eu tinha certeza do que estava fazendo pois poderia desisitir. Não recuei da decisão, até porque tinha concluído que seria uma grande reportagem.
– Vai, mas com muito cuidado! – disse o policial.
A casa era cercada de balaústre. Levantei o bloco e caneta, meus instrumentos de trabalho, para que o homem visse. Ele fez um sinal para que se aproximasse da janela onde se encontrava. Quando eu estava próximo, ele disse:
– Não precisa ficar com medo.
Cheguei até a ele. Estendi a mão para o cumprimento; ele deixou o revólver de lado e fez o mesmo.
– Tudo bem? – Perguntei
– Não ‘tá não, né? Matei um cara e vou preso.
Ele disse que queria dar a entrevista.
Entrevistei-o. Ele me contou que conhecia a vítima e mantinha relação conflituosa com ela e seus familiares. Disse ter sido ameaçado várias vezes e, naquela manhã, quando se encontraram houve nova discussão e o assassinato.
– Ele ia sacar a arma dele. Matei ele. Antes ele do que eu – disse.
Depois da entrevista, perguntei:
– Tudo tranquilo? Posso chamar os policiais?
– Pode chamar. Só dois.
Fiz um sinal em direção aos policiais para que viessem e, com outro sinal, mostrei que deveriam ser só dois.
Com a aproximação dos policiais, ele voltou a pegar a arma, como forma de se garantir.
Os agentes se aproximaram.
Depois, entregou o revólver, saiu da casa e se entregou, sendo algemado e conduzido para o camburão.
Soube depois que, levado a julgamento, foi condenado.
Anos depois, ele foi assassinado a tiros na saida para Três Lagoas.
A polícia recebeu denúncia anônima e encontrou o corpo crivado de balas, em uma mata às margens da BR-163, na saída para Cuiabá. Conforme as informações que recebi, antes de ser morto ele teria rolado no chão como se estivesse tentando escapar dos tiros.
” (…) a, quem cabe a culpa da degradação moral, política e social em que nos afundámos? Por certo que aos governos desonestos e impatrióticos que há tão numerosos anos, têm reduzido o país a esse estado de degradação moral em que nos encontramos. O povo foi tantas vezes embaído em sua boa fé, em sua confiança e em seu patriotismo, que acabou cansado, desiludido, indiferente a tudo. ‘Eu quero que o Brasil se fomente’. Como essa frase suja, ignóbil, torva, saída da bôca de um adolescente, sintetisa e exprime e a irremediável indiferença da massa pela sorte do país“.
0001 | SIGLA | NOME | DEFERIMENTO | PRES. NACIONAL | Nº DA LEGENDA |
---|---|---|---|---|---|
1 | MDB | MOVIMENTO DEMOCRÁTICO BRASILEIRO | 30.6.1981 | LUIZ FELIPE BALEIA TENUTO ROSSI | 15 |
2 | PDT | PARTIDO DEMOCRÁTICO TRABALHISTA | 10.11.1981 | ANDRÉ PEIXOTO F. LIMA (Presidente em Exercício) | 12 |
3 | PT | PARTIDO DOS TRABALHADORES | 11.2.1982 | GLEISI HELENA HOFFMANN | 13 |
4 | PCdoB | PARTIDO COMUNISTA DO BRASIL | 23.6.1988 | LUCIANA BARBOSA DE OLIVEIRA SANTOS | 65 |
5 | PSB | PARTIDO SOCIALISTA BRASILEIRO | 1°.7.1988 | CARLOS ROBERTO SIQUEIRA DE BARROS | 40 |
6 | PSDB | PARTIDO DA SOCIAL DEMOCRACIA BRASILEIRA | 24.8.1989 | MARCONI FERREIRA PERILLO JÚNIOR | 45 |
7 | AGIR | AGIR | 22.2.1990 | DANIEL S. TOURINHO | 36 |
8 | MOBILIZA | Mobilização Nacional | 25.10.1990 | ANTONIO CARLOS BOSCO MASSAROLLO | 33 |
9 | CIDADANIA | CIDADANIA | 19.3.1992 | PLÍNIO COMTE LEITE BITTENCOURT | 23 |
10 | PV | PARTIDO VERDE | 30.9.1993 | JOSÉ LUIZ DE FRANÇA PENNA | 43 |
11 | AVANTE | AVANTE | 11.10.1994 | LUIS HENRIQUE DE OLIVEIRA RESENDE | 70 |
12 | PP | PROGRESSISTAS | 16.11.1995 | CIRO NOGUEIRA LIMA FILHO | 11 |
13 | PSTU | PARTIDO SOCIALISTA DOS TRABALHADORES UNIFICADO | 19.12.1995 | JOSÉ MARIA DE ALMEIDA | 16 |
14 | PCB | PARTIDO COMUNISTA BRASILEIRO | 9.5.1996 | EDMILSON SILVA COSTA* | 21 |
15 | PRTB | PARTIDO RENOVADOR TRABALHISTA BRASILEIRO | 18.2.1997 | LUCIANO FELÍCIO FUCK, Interventor (PetCiv nº 0601743-21.2022.6.00.0000) | 28 |
16 | DC | DEMOCRACIA CRISTÃ | 5.8.1997 | JOSÉ MARIA EYMAEL | 27 |
17 | PCO | PARTIDO DA CAUSA OPERÁRIA | 30.9.1997 | RUI COSTA PIMENTA | 29 |
18 | PODE | PODEMOS | 2.10.1997 | RENATA HELLMEISTER DE ABREU | 19 |
19 | REPUBLICANOS | REPUBLICANOS | 25.8.2005 | MARCOS ANTONIO PEREIRA | 10 |
20 | PSOL | PARTIDO SOCIALISMO E LIBERDADE | 15.9.2005 | PAULA BERMUDES MORAES CORADI (Presidente) | 50 |
21 | PL | PARTIDO LIBERAL | 19.12.2006 | VALDEMAR COSTA NETO | 22 |
22 | PSD | PARTIDO SOCIAL DEMOCRÁTICO | 27.9.2011 | GILBERTO KASSAB | 55 |
23 | SOLIDARIEDADE |
SOLIDARIEDADE | 24.9.2013 | EURIPEDES GOMES DE MACEDO JÚNIOR | 77 |
24 | NOVO | PARTIDO NOVO | 15.9.2015 | EDUARDO RODRIGO FERNANDES RIBEIRO | 30 |
25 | REDE | REDE SUSTENTABILIDADE | 22.9.2015 | HELOÍSA HELENA LIMA DE MORAES | 18 |
26 | PMB | PARTIDO DA MULHER BRASILEIRA | 29.9.2015 | SUÊD HAIDAR NOGUEIRA | 35 |
27 | UP | UNIDADE POPULAR | 10.12.2019 | LEONARDO PERICLES VIEIRA ROQUE | 80 |
28 | UNIÃO | UNIÃO BRASIL | 8.2.2022 | LUCIANO CALDAS BIVAR | 44 |
29 | PRD | PARTIDO RENOVAÇÃO DEMOCRÁTICA | 9.11.2023 | Ovasco Roma Altimari Resende | 25 |
(*) Nos termos do § 1º do art. 58 do estatuto do PCB, para fins jurídicos e institucionais, os cargos de Secretário Geral do Comitê Central e de Secretário Político dos Comitês Regionais e Municipais equiparam-se ao de Presidente do Comitê respectivo. |
As coincidências em atitudes de alguns homens públicos continuam. Eis a carta enviada por um eleitor, um cidadão que se dizia ”doente do Sanatório Boa Vista”, à revista Careta, há 74 anos: “Os homens deste Brasil não têm a mínima noção do ridículo. Nós, os internados do velho sanatório Bela Vista, o mais antigo e tradicional de Correias, ficamos estarrecidos com a fraqueza do Presidente do Ipase, dando o seu próprio nome a este hospital de tuberculosos. E para cohonestar este gesto tão rídiculo de vaidade pessoal, os puxa-sacos do Ipase declararam que fomos nós, os doentes do Sanatório, que o pedimos. Ora, Senhor Redator, nós só pedimos uma coisa: que nos deixem sossegados no nosso canto, com a nossa doença e a nossa tristeza. Se o dr. (nome suprimido eplo zerouminforma) que é um bom moço, camarada e bôa vida, queria botar seu nome no Sanatório Bela Vista, que botasse. Mas que não atribuisse iniciativa tão infeliz e ridícula aos inernados do Ipase. Isso levou os drs. Duat e Benedetti a ficarem como tontos numa correria doida,a arranjar assinaturas para um memorial escrito por eles próprios, para justificar a medida que já tinha sido tomada em nosso nome, mas à nossa revelia. Como esses políticos são desonestos e desprezíveis. Para nós, porém, Sr. redator, o Sanatório continuará a ser ‘Bela Vista’ como sempre foi, e o novo presidente do Ipase, se Deus quiser, ha e saber restabelecer a bôa tradição da casa de Correias, que o dr. Azambuja fundou, sem que seu nome se veja hoje em nenhuma de suas paredes. Homens ingratos e desmemoriados!“.
Veja o diálogo da charge na capa da Revista Careta:
Precaução necessaria
– Para alistar-me no partido, preciso submeter-me ao Raio X?
– Está claro! Você se diz nosso correligionário, por fóra; vamos ver se também o é por dentro!…
FAUSTO BRITES
Madame Direita chegou à cafeteria com a empáfia que lhe era peculiar. Tinha um encontro com uma velha conhecida. Entrou no luxuoso salão, olhou discretamente para os lados e dirigiu-se para uma mesa. Povo, o garçom mais antigo da casa, aproximou-se:
– Em que posso servi-la, madame?
Direita empertigou-se e disse:
– Povo, aguardo aquela minha conhecida. Vê se não me incomode até que ela chegue.
Povo retirou-se pensativo. Passados alguns minutos, surge uma esbaforida Esquerda:
– Demorei, mas cheguei – disse, enquanto puxava uma cadeira. Direita, irritada, não se conteve:
– Atrasada como sempre, né Esquerda?
A resposta veio curta e grossa:
– Raivosa como sempre, né Direita?
– Vamos ao que interessa Esquerda – disse a Direita, pegando a piteira e abrindo a cigarreira.
– Aceita um cigarro?
– Preferia, na verdade, um charuto cubano, mas faço uma concessão.
Povo aproxima-se e gentilmente fala:
– Desculpe-me senhoras! É proibido fumar.
As duas olham com desdém para ele e, num uníssono, dizem:
– Povo, desde quando você manda? Ponha-se no seu lugar.
Povo afasta-se, novamente pensativo.
Direita diz, categórica:
– Esquerda, chamei você aqui porque anda pegando pesado contra mim. Críticas têm limites, né?
– Ora, Direita, estamos no mesmo barco, porque você também acaba comigo quando abre a boca.
– Precisamos nos entender, Esquerda.
– Entre nós, tudo bem. Mas lá fora não tem jeito.
– Não venha, Esquerda, você novamente com essa história de voz rouca das ruas.
– Direita, Direita! Saiba entender o momento.
– Ora Esquerda, sem essa Direita aqui, você não é nada.
– Querida Direita, você é quem, sem essa amiga aqui, pode cair pelas tabelas.
– Acho que não vamos nos entender. É uma discussão estéril – reconhece a Direita.
– Estéril sim e sabe por quê? Anote aí: Direita e Esquerda são hipócritas – afirma a Esquerda.
– Nossa! Acertou na mosca. Somos irmãs siamesas da política. Vamos fazer tim-tim? – propõe a Direita.
Brindam, sorrindo.
– Agora, ao que interessa. Estou sem dinheiro – diz a Esquerda.
– Eu também. Mas não se preocupe. Vamos pendurar a conta.
Direita chama:
– Povo, venha até aqui. Vamos assinar nota. Pagamos depois.
– Mas se as madames assinarem, eu vou ter que pagar a conta.
– Você não está acostumado a pagar a conta, Povo? Mais uma não vai te matar – diz a Esquerda.
– A Demagogia está aí? Chame ela aqui – determina a Direita ao Povo.
Demagogia se aproxima, solícita.
– Esquerda, Direita, que bom ver vocês. O que mandam?
– Nós precisamos sair daqui, mas de maneira discreta. Não quero ser vista com a Esquerda e, com certeza, a Esquerda não quer ser vista com “euzinha”, a Direita. Será que não dá para a gente usar a Conveniência?
– A Conveniência? É claro “amore”. Vou chamar a Corrupção, que ela mostrará a nova saída para vocês. Ela vive inventando novas saídas. Vai dar tudo certo.
Dito isso, soltou uma gargalhada.
Corrupção se aproxima, cumprimenta a Esquerda e a Direita. Sem fazer comentários, a Corrupção leva Direita e Esquerda por um corredor mal-iluminado até a Conveniência e indica duas portas opostas. Ordena, com um sorriso irônico:
– Direita, use a esquerda. Esquerda, use a direita.
(Publicada originalmente no jornal diário Correio do Estado/ Chage de Éder)
Fausto Brites
(Os nomes das pessoas são fictícios)
Ele se aproximou e disse ao meu amigo Steve :
– Vou ensinar a você a nunca mais brigar com mulher!. Era Eslav.
Repentinamente o restaurante ficou vazio. As pessoas quase nos derrubaram na saída apressada, temerosas de que haveria um tiroteio.
O caso ocorreu em Ponta Porã, cidade que faz divisa com o Pedro Juan Caballero, no Paraguai, e onde o número de execução é elevado. Nos meios jornalísticos, o costume era dizer que naquela região não existe ”bala perdida” pois sempre ”encontra o alvo”. Estávamos na cidade trabalhando na campanha eleitoral para o candidato a prefeito Gregory que disputava a prefeitura.
Pela primeira vez seria levado ao ar um programa de TV no horário gratuito, na cidade, e a equipe era formada por diversos profissionais. Uma ampla casa havia sido alugada nas proximidades da linha internacional onde funcionava os estúdios. Minhas funções era a coordenação do programa de rádio.
Havia rivalidade política, é claro. Gregory era muito ”massacrado” nos programas eleitorais dos adversários mas, conforme a orientação dos coordenadores de campanha, o contra-ataque seria só em casos extremos, mas no terreno da campanha politica. A ideia era apresentar as dificuldades da população, assim como propostas e projetos que pudessem melhorar a situação dos moradores. Ataques pessoais aos adversários estavam fora de cogitação.
O fato de participar de uma campanha eleitoral na fronteira não significava, pelo menos para mim, algo temerário, apesar de histórias e acontecimentos que pudessem mostrar ao contrário. Além do mais, Ponta Porã é minha terra natal.
Um desses acontecimentos, por exemplo, envolveu uma jornalista da equipe que, ao chegar em casa foi rendida por dois assaltantes e teve o carro (locado) levado pelos marginais para o Paraguai. Dias depois, o veículo foi recuperado e, segundo se informou na época, com a morte dos envolvidos no roubo.
Outro episódio foi quando, em conversa com uma das integrantes da equipe (da área administrativa), eu reclamei que Bob, um dos candidatos estava sendo muito inconveniente durante o jantar onde estávamos. Um dos seus assessores de campanha ouviu, contou a ele que veio tirar satisfação e fazendo ameaças. ”Vou te deixar jogado lá no Marco Grande”, disse ele. O chamado Marco Grande fica na divisa Ponta Porã-Paraguai e onde geralmente eram encontrados corpos dos executados.
Os coordenadores da campanha intervieram e, no dia seguinte, foi marcada uma reunião e nós dois conversamos e as arestas foram aparadas. Durante o período que durou a campanha, vale dizer, ele foi o candidato mais dedicado nas gravações, no cumprimento do horário e na demonstração de respeito a todos os jornalistas.
Os integrantes das equipes foram alojados em casas diferentes. Os responsáveis pelos programas de rádio, por exemplo, ficaram em um casarão de altos muros e que havia até guaritas. Fomos informados de que o imóvel tinha pertencido a um conhecido pistoleiro da região que fora executado, com dezenas de tiros, numa das avenidas da cidade. Para que houvesse, digamos, tranquilidade foi determinado pelos coordenadores políticos da campanha que na guarita (que ficava vazia, é claro) fossem colocados adesivos do candidato Gregory como ”senha” para que nenhum dos moradores – no caso, nós – fosse incomodado.
Com o decorrer dos trabalhos, é claro que surgiram momentos de estress entre os integrantes da equipe. Foi o que ocorreu entre Steve e a jornalista encarregada de coordenar a captação das imagens para a produção dos programas de TV.
E foi Eslav, o motorista, morador da cidade e que atendia a jornalista, que decidiu dar uma de ”cabra macho” e tentar que poderia resolver a situação à bala. Isso depois de muitas doses de uísque no referido restaurante onde, depois do trabalho extenuante do dia, as equipes se reuniam para jantar, avaliar o trabalho, discutir novos programas, e até mesmo para relaxar.
Voltamos à noite da ameaça.
Quando as pessoas saíram correndo temendo o tiroteio, o ”pistoleiro de ocasião” Eslav distraiu-se e, assim, o cinegrafista colocou as mãos numa das cadeiras e ficou preparado para, ao menos, reagir caso o motorista sacasse o revólver.
– Vamos parar com isso! Larga de besteira! Volte lá pro seu uísque – disse eu ao embriagado ”pistoleiro”. Não que eu estivesse com a mínima vocação de ser herói, até porque eu realmente estava temeroso com o momento uma vez que fiquei ”sitiado”: um ameaçando matar e o outro com as mãos em uma cadeira para reagir. Eu, no meio. Ou levaria tiro ou uma pancada na cara.
Fiquei mais aliviado quando o motorista começou a perdeu a sanha sanguinária e, também, passou a cambalear ainda mais como se, ao levantar para fazer as ameaças, todo o álcool teria afetado sua coordenação motora.
Repeti a cantilena para que voltasse para a mesa, falei de que ele tinha que pensar na família e outras coisas que nem sequer me lembro mais. Nem ele, é claro. A jornalista, que estava na mesa com ele se encontrava antes, levantou-se e também interferiu, retirando-o do local. Sugeri ao companheiro Steve que também fosse embora. Minutos depois chegou um dos líderes políticos da cidade para saber o que havia acontecido e se estava tudo bem.
O motorista Eslav foi desligado da equipe. Com o término da campanha, segundo as informações, ele foi preso por não pagamento da pensão alimentícia. Dias depois, teria sido assassinado e o corpo encontrado em uma estrada vicinal.
Já o candidato Bob (ele não foi eleito) que teria feito a ameaça de ”me deixar” no Marco Grande foi executado quando estava numa barbearia, meses depois. Segundo consta, o motivo teria sido por desavenças comerciais.
Pistoleiros entraram no local, fizeram sinal para que o barbeiro se afastasse e atiraram várias vezes contra Bob, segundo fique sabendo de fontes fidedignas.
O candidato a prefeito Gregory ganhou a eleição. Dois anos depois, candidatou-se à uma cadeira na Câmara dos Deputados e a conquistou.
No dia 15 de setembro de 2015, já sem mandato, foi executado por pistoleiros, em plena luz do dia, quando saía de uma repartição pública situada em uma das principais avenidas de Ponta Porã.
Foto: Ponta Porã / Paraguai
Crédito: Fausto Brites
Por Fausto Brites
– Está preso aí um estelionatário. Ficou enrolando para confessar, mas eu dei um jeito. Arranquei o bigode dele no alicate – disse, sorridente, o delegado quando eu cheguei e perguntei a ele se tinha alguma “bronca” naquele dia.
– O senhor fez o quê? – questionei.
– Arranquei o bigode desse estelionatário no alicate. Contou tudinho. Andou aplicando uns golpes por aí. Tá lá, agora, quietinho.
Perguntei se poderia fotografar o preso e ele autorizou. Fui até a cela e fiz um close do acusado na inseparável Yashica. O delegado mostrou uma foto do preso – feita anteriormente – na qual este ostentava um farto bigode. Sua única preocupação era com um possível processo, pois o acusado o ameaçou de denunciá-lo em razão da tortura.
Recolhi as informações e voltei para a redação. Avisei do caso para o chefe de redação, o jornalista Antonio João Hugo Rodrigues, e a foto foi ampliada. Não havia dúvidas: o estelionatário apresentava falhas em seu bigode. A tortura estava comprovada. Na edição do dia 14 de outubro de 1975, a manchete era: “Delegado arranca bigode de preso com um alicate”. Foi um escândalo à época.
Depois que a edição chegou às bancas, o que mais se ouvia na cidade era o caso do “delegado malvado”. As opiniões se dividiam: uns acharam que tinha sido um absurdo, um abuso de autoridade; outros, que a medida tomada tinha sido acertada. “Ele fez bem. Bandido não pode ser tratado com flores na delegacia. Se é prá tratar marginal a pão de ló, então não precisa de polícia”, defendeu o delegado um taxista, do qual eu era amigo e cliente.
O delegado regional à época abriu um inquérito administrativo para apurar as responsabilidades pela tortura contra o estelionatário, conforme informava a edição do dia seguinte (15 de outubro). Ele disse que somente tomou conhecimento do caso quando leu o Correio do Estado. Anunciou que iria esperar o registro da queixa – crime da vítima para prosseguir na investigação do ato do delegado o qual classificou como “desumano”, e acrescentou: “se for real”. Apesar de a própria autoridade ter me contado o caso de sua autoria, ainda assim a ocorrência era colocada em dúvida. Falava-se que nada aconteceria – e isso foi divulgado – porque “o delegado tem costas quentes”.
De Cuiabá, capital do Estado, o secretário de Segurança Pública, Madeira Évora, ao ser informado sobre o caso, mandou que fosse apurado com rigor.
Para ele, era inconcebível que um preso fosse tratado desta forma, principalmente quando Campo Grande ganhava investimentos na área.
Explica-se: Campo Grande teve um longo período em que a Polícia Civil contava apenas com a chamada Delegacia Central (na Rua 14 de Julho, entre as ruas 7 de Setembro e 26 de Agosto), a Delegacia do Bairro Amambai, ambas sob jurisdição da Delegacia Regional. A partir de 1977, o governo do Estado reestruturou o setor criando as chamadas “distritais” que foram instaladas em bairros mais populosos. Com isso, houve aumento de efetivo, de viaturas e área de atuação dos policiais. Evidentemente que, a partir daí, as exigências passaram a ser maiores por parte da Secretaria de Segurança Pública, uma vez que as nomeações também deixaram, em sua grande maioria, de ser política (muitos agentes não eram concursados).
O delegado estava preocupado com a situação negativa do caso e ameaças veladas eram feitas contra os jornalistas que passaram a acompanhar o caso. Houve informações de que comentários dos familiares da autoridade eram de que estavam acostumados a “capar certas pessoas” que, segundo o Correio do Estado, era uma forma de intimidação. O regional, conforme publicado na edição do dia 16 de outubro, tentou mais uma vez amenizar o fato. Eis trecho da reportagem daquela data: (…) “disse não acreditar na ‘tortura do alicate’, mas tão somente no corte do bigode do estelionatário. O regional, entretanto, admitiu que o delegado ‘para dar uma de macho’ teria dito aos quatro ventos que arrancara o bigode do detido na base do alicate”. (…) .
Na edição seguinte (17 de outubro), a manchete: “Confirmada a tortura do alicate”. O estelionatário foi intimado e compareceu à Delegacia Regional onde, acompanhado com seu advogado, contou que realmente teve “tufos” do bigode arrancados pelo delegado.
Além disso, afirmou que, para praticar o ato de violência, aquela autoridade policial contou com apoio de alguns agentes, e denunciou também que sofreu espancamentos. A situação, portanto, se complicava cada vez mais para o delegado e sua equipe, a que estava de plantão na noite em que ocorreu o fato. O delegado regional, que assistiu ao depoimento, disse ter ficado “estarrecido” com a denúncia.
O desfecho foi publicado na edição do dia 18 de outubro, quando o delegado reassumiu o cargo. Conforme o regional, não ficou comprovada a tortura e o exame do corpo de delito no estelionatário não apresentou “nenhum indício de que a tortura noticiada aconteceu”. Eis um dos trechos da reportagem: “Dizendo-se inimigo de qualquer ato de sevícia – o delegado regional, inexperiente, não conhece os anéis de choque e as palmatórias – garantiu que caso ficasse devidamente comprovada a denúncia, o delegado seria afastado definitivamente”. Prosseguiu dizendo que como o inquérito administrativo “orientado por aquela autoridade nada apurou de positivo”, o titular da distrito foi reconduzido ao cargo “ficando o assunto da ‘tortura do alicate’ debitado unicamente ao sensacionalismo do próprio acusado como torturador. Afinal, foi ele mesmo que disse ter torturado o preso”.
(Publicado originalmente no jornal diário Correio do Estado)
Por Fausto Brites
Campo Grande é uma terra maravilhosa. Mas, costuma ter entre seus viventes algumas personagens que são capazes de fazer anjo de pedra ficar corado, como se dizia antanho.
Estava eu aqui mexendo nos meus alfarrábios e, eis que, vi um papel sobre uma audiência no Juizado de Pequenas Causas (nem sei mis se esse é o nome, ainda) para uma audiência, aliás, era a segunda marcada pois a primeira a figura, contra quem movi uma ação, não apareceu.
Fiquei pensando na história e conto aqui para o distinto leitor.
O caso envolve um ”publicitário”, um sujeito que costuma comer carner carne moída e dizer que se deliciou com faisão e codornas. O cara, aliás, é tremendo de 171 e muito conhecido no meio da mídia.
Pois bem. O cara tinha umaa agência de pubicidade que, na realidade, se transformou em uma arapuca.
No fim de determinado ano, o cara estava quebrado, devendo na praça, mas deicdiu continuar vivendo à farta (com dinheiro dos outros, é claro).
Assim, as mídias do poder público que su a agência encaminhou para os órgãos de imprennsa foram pagas pelo Estado, mas ele não depositou um ”dólar furado” para as empresas jornalísticas que divulgram as campanhas.
Macomunando com outro pilantra ‘que se dizia gerene da tal agência, o dito-cujo ”anoiteceu e não amanheceu” nas luxosas salas que alugava em um edifício da Capital. Sumiram que não deixaram nem rastro.
Soube, depois, que o picareta havia levado a família para o dolce far niente nas praisas do Nordeste. Curtiu a vida como se fosse milionário. O tombo nas empresas teria sido na ordem de R$ 400 mil.
Movi a ação contra o malandro que não compareceu em nenhuma das aduiências.
Hoje o car anda por aí como se fosse vestal da honestidade.
O ditado popular ensina que ”quem bate, esquece; quem apanha, não”.
Para o desespero do malandro em questão eu não esqueci.